domingo, 9 de outubro de 2011

A lenda do 'violeiro' que tocava 'rio abaixo'




Reza a lenda que no norte de Minas, às margens do Rio Urucuia que foi tema do livro "Grande Sertão - Veredas" do consagrado escritor João Guimarães Rosa, nas noites de sexta-feira, próximo à meia-noite, um misterioso pirangueiro descia rio abaixo em sua canoa, ponteando sua viola em uma afinação desconhecida na região até então...

A população ribeirinha tratava de fechar as janelas de suas cabanas e se punham a rezar ao ouvir o ponteado daquela viola misteriosa... um ponteio diferente... um "toque" nunca antes ouvido que enchia aquele povo simples de pavor e admiração pois a viola sempre foi um instrumento típico do meio rural desde os tempos da colonização; Foi trazida de Portugal para o Brasil pelos primeiros colonizadores e Jesuítas que utilizavam seus acordes harmoniosos em cantigas de roda e cânticos religiosos... Não é à toa que até hoje ela é o instrumento tradicional da "folia de reis" no Sudeste, dos "desafios" entre repentistas no Nordeste e das polcas, guarâneas e raqueados do Centro-oeste... O violeiro de antigamente gosava de um certo "status" na sociedade daquela época, era convidado tanto para as festas religiosas como para os "desafios" e "arrasta-pés" do sertão... Mas naquela região do Urucuia algo de sobrenatural estava acontecendo...

Aquele "violeiro" não era deste mundo... ninguém em sã consciência desceria religiosamente nas noites de sexta-feira rio abaixo ponteando a viola naquela escuridão com tanta naturalidade e maestria... Logo boatos começaram a circular: o misterioso violeiro não era ninguém mais que o próprio "dito cujo", o "capiroto", o "tinhoso" em pessoa que descia rio abaixo à procura de violeiros com coragem suficiente para desafiá-lo... ou quem sabe à procura de moças desavisadas, apaixonadas pelo ponteio da viola que até hoje "encanta" tanta gente...

E esse boato rendeu muitas "histórias e causos"... Mas o fato é que os violeiros daquela época remota acabaram "pegando de ouvido" aquela afinação e a batizaram de "afinação rio abaixo" ou "afinação do capeta" como alguns preferem... Em todas as regiões do Brasil, várias afinações foram criadas, algumas "alteradas" ou com diferentes nomes, mas nenhuma possui o "encanto e o mistério" da afinação rio abaixo. Junto com a afinação "cebolão" é uma das mais utilizadas por nossos violeiros e cantadores.

Fato curioso é que lá nos EUA muitos "guitar man" do velho "blues" americano afinam seus instrumentos (guitarras e violões) nesta afinação... E lá também não faltam histórias misteriosas como o suposto "pacto" do famoso Robert Johnson na encruzilhada... Mas isso é uma outra história... 

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